Produtos proibidos
Importadores pressionam liberalização de material pornográfico
Aprovável alteração da Pauta Aduaneira no próximo ano já faz com que alguns sectores empresariais dedicados à importação de variadíssimos produtos pressionem a Direcção Nacional das Alfândegas no sentido de permitir a entrada no país de produtos até agora tidos como pornográficos.
Actualmente, a Direcção Nacional das Alfândegas desenvolve uma série de consultas com diversos organismos ministeriais e empresariais, sendo nestes últimos onde se situam os indivíduos que pretendem ver alterados alguns pontos do artigo 54, constantes do decreto 2/ 08 de 4 de Agosto, particularmente os que proíbem a entrada em Angola de bebidas ou comprimidos estimulantes sexuais, livros, impressos, fotografias, fitas cinematográficas, desenhos, estampas, objectos pornográficos ou de estímulos sexuais.
Na realidade, de acordo com informações apuradas por este jornal, as autoridades alfandegárias e a própria Polícia Fiscal têm permitido apenas a entrada destes materiais pornográficos quando se apresentam como para uso próprio, proibindo apenas a importação de grandes quantidades destinadas sobretudo para a comercialização. Mas estes limites não travam a existência cada vez maior destes produtos pornográficos, cuja comercialização é tida como proibida, sendo o caso mais flagrante a venda nas principais praças da cidade de vídeos ou DVDs com filmes de cariz sexual.
“A venda de filmes pornográficos também é crime. E como a pornografia vem em DVD, está abrangida igualmente nos artigos 31, 32 e 34 da Lei 4/90 de 10 Março, que é a chamada Lei dos Direitos de Autor. Pune com prisão e multas aqueles que forem apanhados a comercializar tais produtos”, contou uma fonte afecta à Direcção Nacional de Inspecção às Actividades Económicas, a conhecida Polícia Económica.
A comercialização de filmes é apenas a ponta mais visível de um mercado negro existente há anos em Luanda e arredores onde qualquer cidadão pode encontrar variadíssimos produtos libidinosos e outros até agora tidos por alguns sectores mais conservadores da sociedade angolana como perversos.
Maria António (nome fictício), secretária de um conhecido grupo empresarial contou a O PAÍS que já conseguiu comprar aqui mesmo em Luanda óleos exóticos, líquidos para fricção dos órgãos genitais, fantasias diversas, borboletas clitorianas que dão a sensação de alcance de orgasmos e outros produtos.
A primeira vez que teve acesso aos referidos produtos foi por intermédio de algumas comerciantes brasileiras que se dedicam oficialmente a comercialização de roupas, mas que tinham à disposição outros produtos, incluindo vibradores (pénis artificiais).
“Tive conhecimento porque uma amiga contou-me da presença delas. Eram sobretudo pessoas que vendiam roupas, mas inicialmente pedimos que nos trouxessem estas coisas. Pessoalmente nunca comprei um vibrador, mas tenho colegas que já compraram vários”, explicou a jovem de 36 anos, acrescentando que “não se tratam apenas de produtos para mulheres. É para a brincadeira dos próprios casais”.
Normalmente, Sandra Pascoal (outro nome fictício, que introduzimos a pedido da própria entrevistada), publicitária, contou a este jornal que inicialmente adquiria alguns destes ‘produtos proibidos’ quando se deslocasse a Portugal, África do Sul ou Brasil, mas hoje encontra-os aqui mesmo em Luanda, das mãos das conhecidas “moambeiras” que se dedicam legalmente à venda de roupas.
Segundo ela, os óleos para massagens que devem ser friccionados nos órgãos genitais masculinos ou femininos adquiri-os numa conhecida casa de cosméticos, cuja denominação preferiu omitir. “Há de tudo um pouco aqui, desde os óleos relaxantes, pastilhas, um kit de bolinhas, cuecas comestíveis com sabores que vão desde o morango ao chocolate e ao pêssego, assim como uma tampa de chocolate, também comestível, com que as mulheres podem tapar o seu sexo e os homens comem durante as preliminares”, acrescentou.
Sandra explica que na capital do país o preço de um vibrador pode ficar entre os 150 e 200 dólares norte-americanos, independentemente da cor de cada um. Diz ela que os vibradores pretos chegam a ser mais caros, porque “é raro de se encontrar”. Quanto aos óleos relaxantes, segundo a nossa interlocutora, os frascos custam entre os 20 e 25 dólares cada.
“As pessoas que vendem roupa também trazem isso. Nas conversas com as amigas ficamos a saber de tudo”, contou a senhora, a caminho dos 40 anos de idade, revelando que “outras fantasias como as de enfermeira, professora, tigre, cozinheira ou gata selvagem custam entre 100 e 120 dólares, podem ser encontradas em muitas casas de roupa íntima em Luanda, mas só que muitas das vezes não são expostas ao público”.
Tabu?
As duas interlocutoras deste jornal concordaram que apesar da proibição da entrada de material pornográfico, principalmente quando destinado ao comércio, aumenta consideravelmente o número de pessoas que utilizam os adereços sexuais que mencionaram.
Maria António considera que servem para “brincadeira dos casais”, ao passo que Sandra Pascoal acredita que é “para quebrar a monotonia do casal”. A segunda justifica o uso os referidos produtos “porque é uma forma indirecta de manter a relação, tendo em conta o stress que as pessoas aparentam quando regressam à casa”.
Alfândega nega pressão
Uma fonte do gabinete do director nacional das Alfândegas, Sílvio Burity, que preferiu falar sob anonimato, não confirmou a existência de pressões
a nível dos importadores para que se liberalize a entrada de material pornográfico.
Segundo a fonte, o decreto-lei 2/08 de 4 de Agosto estabelece os referidos produtos como mercadorias de importação proibida quando importados para fins comerciais. Garantiu que estas mercadorias não são interditas quando entram em quantidades não comerciais, porque a alfândega não tem competência para os travar.
Questionada outra vez sobre a existência de informações que apontam para algum tipo de pressão no sentido da liberalização dos referidos produtos, a fonte disse que a “Alfândega reserva-se apenas ao direito de verificar a qualidade, quantidade e a
Aspecto (desfocado) de uma sexy shop. em natureza da mercadoria importada, quer seja por via terrestre, marítima ou aérea. Desde que não colidam com os procedimentos aduaneiros”.
A fonte reconhece a presença de quantidades consideráveis dos materiais tidos como proibidos a serem comercializados em alguns pontos da cidade, principalmente revistas pornográficas. Ela acredita que é uma mercadoria que entra através do contrabando, ou seja, de forma camuflada.
“O contrabando acontece de várias formas, seja ela terrestre, marítima ou aérea. Nós trabalhamos com base num perfil de risco, quando uma determinada importação cai neste perfil actuamos”, justificou.
Para que a Direcção Nacional das Alfândegas deixasse de ver os referidos bens como mercadorias proibidas seria necessária a alteração da Lei. O próprio decreto-lei que estabelece a proibição não é um produto desta instituição afecta ao Ministério das Finanças, que actualmente está em concertação com outros ministérios, instituições comerciais e empresariais para a actualização da nova Pauta Aduaneira. A nova será harmonizada já no próximo ano, segundo informações apuradas por este jornal.
“Não posso dizer que seja isto que leva algumas pessoas a pensarem que se pode mexer nos pontos proibidos, porque nada nos levou até agora a pensar assim”, rematou a fonte do gabinete do director nacional das Alfândegas, Sílvio Burity.
Dani Costa
11 de Julho de 2011
http://www.opais.net/pt/opais/?id=1657&det=22066&mid=
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