terça-feira, 9 de julho de 2013

A 'cura' que faz adoecer


viva
03/07/2013 06:30
MICHELI NUNES
Especialistas explicam que tentar forçar alguém a rejeitar orientação sexual pode causar transtornos
micheli.nunes@diariosp.com.br
A OMS (Organização Mundial da Saúde) entende que a homossexualidade é uma variação natural da sexualidade e não se trata de uma doença. A partir daí, uma resolução do CFP (Conselho Federal de Psicologia) proibiu os profissionais de participarem de terapia para alterar a orientação sexual de uma pessoa. 

O tema veio à tona quando o deputado federal João Campos (PSDB-GO) protocolou, na Câmara dos Deputados, um Projeto de Decreto Legislativo (PDC 234/11) que propõe suprimir essa resolução específica. Mas depois de protestos da população em todo o Brasil, Campos desistiu do projeto na tarde de ontem – ele não teve nem mesmo o apoio do próprio partido.

Especialistas da área explicam que não é possível mudar a orientação sexual de uma pessoa e argumentam que tais tratamentos podem gerar angústia e outros transtornos. “Mesmo que a orientação sexual seja um problema para uma ou outra pessoa, não é  considerada uma doença”, explica o psicoterapeuta sexual Oswaldo Rodrigues. Ele, no entanto, assegura que qualquer pessoa, independentemente da orientação sexual, pode receber tratamento psicológico. “Se a sexualidade for um problema para uma pessoa, esta pode receber a atenção da psicoterapia para aliviar-se do sofrimento.”
Márcia Almeida, psicóloga e professora da PUC-SP, explica o ponto de vista da psicologia. “Se um paciente tem dificuldade em lidar com a própria orientação, o tratamento não pode, de maneira nenhuma, se tratar da sexualidade em si, mas da maneira como ele lida com ela”, afirma.
Para a especialista, a vida que o paciente pretende levar precisa partir dele, não do psicólogo. “É nosso dever ajudá-lo a compreender a própria orientação sem impor nossas crenças pessoais. Forçar uma pessoa a assumir uma posição que não está de acordo com sua orientação interna só aumenta a angústia e o sofrimento dela”, diz Márcia. Oswaldo acrescenta: “A psicoterapia serve para que o paciente compreenda o que está passando, quais são seus planos de vida e o que deve alcançar com a busca. Organizar-se após reconhecer-se é um caminho que ele decide, não o profissional”.

Os especialistas concordam que a melhor maneira para lidar com a sexualidade é a autoaceitação. “A valorização do indivíduo é uma missão da psicologia. Autoaceitação tem de ser compreendida pela pessoa para administrar sua realidade individual na sociedade”, diz Oswaldo. O psicoterapeuta conta também que a visão binária da sexualidade é atrasada. “O termo orientação sexual tem um amplo espectro ainda não debatido. Pouco se tem falado sobre bissexuais, por exemplo. A orientação sexual ainda deve ser melhor compreendida”, defende. 

‘Félix é mau por não ser aceito’, diz Carrasco
Autor da novela “Amor à Vida”, Walcyr Carrasco, que recentemente se declarou bissexual, conta que o motivo da maldade do personagem Félix (Mateus Solano) vem do fato de que ele não se aceita. “A repressão torna as pessoas amargas, revoltadas  e com problemas psicológicos fortíssimos”, afirma ele. “Reprimir a sexualidade provoca até distorções de personalidade. É o caso do Félix, a repressão que ele viveu o tornou assim: mau. Ele sofre por não ser aceito pelo pai e isso o faz odiar a irmã”, conta o autor, que tem uma visão mais ampliada sobre  sexualidade. “Não acredito que seja possível mudar a orientação sexual de alguém, entretanto não acho que as pessoas sejam tão simples assim.  Gosto de fugir de rótulos e, no mundo de hoje, as pessoas procuram várias experiências”, reflete o autor.
Carrasco, que diz não pretender abordar a chamada “cura gay” na novela, reiterou seu repúdio ao projeto. “A decisão do Conselho de Medicina está de acordo com Organização Mundial de Saúde, que não considera a homossexualidade como doença. É uma decisão de caráter científico e não se pode misturar politica com ciência porque, neste caso, quem sairá perdendo é a ciência. Mas é só a ciência que deve determinar tratamentos e a forma de condução da orientação sexual de cada pessoa”, afirma.
http://www.redebomdia.com.br/noticia/detalhe/53151/A+'cura'+que+faz+adoecer

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