segunda-feira, 8 de agosto de 2011
FORMAÇÃO DA SEXUALIDADE E PRECONCEITO - POR OSWALDO RODRIGUES JR.
Alguns passam a ter desejo sexual por pessoas de outro sexo na fase da puberdade. Outros descobrem esse sentimento na adolescência. Há ainda aqueles que nunca conseguirão se classificar. Muitos são vítimas de preconceito e de exclusão. De acordo com o diretor do Instituto Paulista de Sexualidade (InPaSex), Oswaldo M. Rodrigues Jr., uma das necessidades mais importantes na vida de uma pessoa é o sentimento de pertencer a um grupo que o acolha e lhe dê proteção.
“Sentir-se excluído por qualquer razão será um motivo de sofrimento”, diz o psicólogo e psicoterapeuta sexual, que segue abordagem psicológica comportamental-cognitiva.
O InPaSex atua em questões relacioandas a disfunções sexuais e queixas relativas à sexualidade do ponto de vista da psicologia, fornecendo psicoterapia a indivíduos e casais que buscam superar problemas que vivenciam nestas áreas. O diretor Oswaldo Rodrigues fala sobre a formação sexual do ser humano e os impactos do preconceito contra crianças e adolescentes homossexuais.
Com qual idade é comum uma pessoa descobrir sua sexualidade?
Existem várias partes do que se tem sido chamado de “sexualidade”. A sexualidade é composta de vários graus de identidades que se sobrepõe. A “identidade de gênero”, que significa descobrir se pertence ao grupo dos homens ou das mulheres, ocorre nos dois primeiros anos de vida e se confirma aos 7 anos. A maioria das pessoas desenvolve uma identidade de gênero de acordo com o sexo genital. A “identidade sexual social” é percebida com expressões e formas de fazer as coisas como masculino ou feminino. Estas características são aprendidas e assimiladas desde o nascimento e firmadas por volta dos 7 anos, quando a criança passa a exercitar o “ser homem” ou “ser mulher” a partir das expressões sociais e externas.
As designações “objeto sexual”, “opção sexual” e “orientação sexual” implicam gramaticalmente em qual deverá ser o objeto da satisfação sexual da pessoa. Precisamos observar um contínuo entre dois extremos, para começar: da heterossexualidade à homossexualidade, com vários graus de bissexualidade intermediários. Ainda existe a assexualidade e a preferência por objetos/partes do corpo. Estas formas são estados de ser que podem dominar a vida toda ou serem fases com durações mais ou menos prolongadas gerando identidades sociais diferenciadas. Algumas destas identidades são pronunciadas e visíveis de acordo com momento histórico, valores e mecanismos de tolerância à frustração por parte dos indivíduos de uma cultura.
Há 500 anos se ateava fogo a uma pessoa de genitália ambígua ou transexual. Há 100 anos se mandava para a prisão quem fosse homossexual. Ainda hoje há quem não acredite que bissexuais existam e se ridicularizam assexuados e parafílicos como pervertidos. Esta fase objetal implica em designar o outro como fonte de satisfação sexual ou de satisfação afetiva. Ambas as formas são consideradas sexualidade em nosso momento cultural, embora sejam qualitativamente diferentes. Algumas pessoas iniciarão esta fase ao redor da puberdade, outras na adolescência, e outras após os 18-20 anos de idade. Muitas passarão por momentos de variação ao longo de 5 ou 6 décadas de vida. De toda forma, não se pode dizer se uma criança terá orientação sexual hetero, homo, bi, assexual ou objetal. Muitos sequer conseguirão classificar-se mesmo sendo adultos (por mais que possam ser classificados pelo mundo externo).
Quando a criança descobre que é minoria entre os seus colegas, como ela se sente?
Uma das necessidades de importância na vida de uma pessoa será o sentimento de pertencer a um grupo que o acolha e lhe dê proteção. Sentir-se excluído por qualquer razão será um motivo de sofrimento. Este sofrimento poderá produzir uma capacidade de administrar as frustrações que ocorrerão ao longo de toda a vida, sendo um produto positivo de uma condição negativa. Porém, a maioria das pessoas reage de modo negativo, desenvolvendo o que se denomina de baixa autoestima, autoidentidades negativas e passa a associar-se adjetivos negativos que o conduzirão a comportamentos e atitudes negativas e contraproducentes sobre si e sobre o mundo. As pessoas que poderão aprender a administrar as frustrações destas exclusões, vivendo como minoria, serão os mais ilustres e mais bem-sucedidos daquele mesmo grupo. Assim, em determinado momento, sentir-se mal não é exatamente apenas negativo. Se a criança tem acolhimento em outras áreas, provavelmente ela se perceberá diferente, e não excluída, mesma que assim o seja.
A exclusão pode se dar não por ela ser diferente, mas pelo grupo necessitar de um bode expiatório, para os indivíduos do grupo sentirem-se bem. Assim são as histórias de crianças chamadas de “bicha”, que recebem toda a carga negativa que os colegas têm, não por ser homossexual, mas para servir de expiação dos problemas do grupo. O mesmo ocorre na família, onde pais e irmãos usam palavras negativas para sentirem-se bem e superiores. A criança assume a identidade homossexual não por desejar outro de mesmo sexo, mas para cumprir um papel de carregar as dificuldades da família. Mais provavelmente esta criança desenvolverá preferências homossexuais, pois o mundo já participa com determinantes coerentes ao epíteto designador.
É comum adolescentes tirarem sarro, implicarem e até praticarem bullying com os colegas. Como esse comportamento é visto dentro da psicologia?
A competição é um dos mecanismos para produzir características úteis na sociedade adulta. A competição entre crianças é moldada nos adultos que as cercam. Entre a idea de competição e uma agressão existe grande diferença que precisa de ponderação. Por isso o termo bullying. Uma criança hostil vem de lares hostis ou ela é perturbada em termos de personalidade. O mais comum é a criança copiar comportamentos que assiste em casa: violência de gênero. A criança repete o que vivencia, pois é assim que compreende que deve ser o mundo.
Quais cuidados as escolas devem tomar para que alunos homossexuais não sejam vítimas de bullying?
A discussão sobre as possibilidades de identidades de gênero, expressões sexuais sociais, formas e preferências sexuais deveria ser compreendida pelos professores, pois eles é que passarão esta compreensão para os alunos. Isto exige atuação cotidiana, não apenas em uma ou outra aula especial (como em muitas escolas ainda chamam inadequadamente de “educação sexual”). Isto ainda é e ainda será muito complicado, pois envolve discussões de valores pessoais e grupais para os adultos. O mundo se encontra em constante mudança. Parodiando Henry Havelock Ellis no começo do século XX: “se tudo no universo se encontra em constante movimento, porque o ser humano seria estático?”
Crenças e valores de adultos não são modificados com facilidade. Por isso existe a psicoterapia, um processo que permite mudanças e não é baseado em apenas informações e conhecimentos. A informação permite o debate, mas não muda crenças. Na maior parte das vezes as informações são utilizadas para manter crenças e não modificá-las. A construção das crenças estereotipadas socialmente é feita de modo pedagógico. Isto se diferencia do método psicológico, focado no indivíduo e não na informação. Assim, muitos dos professores que têm dificuldades em administrar o “diferente” precisariam aprender a mudar suas crenças para que convivessem com os diferentes. As crianças só copiam e seguem os modelos dos adultos.
Um estudo da Universidade de Columbia (EUA) mostrou que adolescentes gays têm até cinco vezes mais chances de se matar do que os heterossexuais. Existe alguma pesquisa como essa no Brasil que o senhor possa destacar?
Várias pesquisas brasileiras têm sido feitas e várias conclusões são tiradas há 30 anos. Grupos de apoio a adolescentes homossexuais têm sido tentados. Problemas legais de pais não aceitarem seus filhos não os permitindo sequer discutirem e compreenderem se realmente são ou não homossexuais apenas facilitaram o aumento destas estatísticas. Psicólogos que atendem adolescentes sabem disso ao verem seus pacientes trazerem estas discussões. Eles levam muitas semanas para confiarem no terapeuta, pois o mecanismo mais degradado é o da confiança em outros superiores.
Qual é o impacto que o preconceito pode ter na vida da criança e/ou do adolescente homossexual?
Isto sempre dependerá das características de personalidade que a criança e o adolescente estão desenvolvendo. Assimilar-se negativo ou positivo frente as adversidades será determinante para produzir um impacto e de que tipo.
Psicanalista Oswaldo Rodrigues Jr.
Psicanalista Oswaldo Rodrigues Jr.
Fonte: G1
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