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quarta-feira, 15 de junho de 2011

"Nietzsche e as travestis idosas"

"Nietzsche e as travestis idosas"
Pedro Sammarco |
Em Assim falou Zaratustra o filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900) através de seus aforismos filosóficos, fala sobre o percurso de um novo começo para a afirmação da vida. Trata-se das transformações ocorridas pelo espírito do homem que se torna camelo, leão e por fim, criança. Transformar-se em camelo representa ajoelhar-se para carregar todos os valores morais e a culpa do mundo. É o “dever ser” contido nos valores morais. Em geral somos formados culturalmente para sermos sempre camelos.

Tal como o camelo caminha carregado de mantimentos para o deserto, o homem caminha para o seu próprio deserto carregado de moralidades sociais. O vazio do deserto auxilia no processo de criatividade. Lá ocorre a segunda transformação quando o camelo vira um leão. Tem condições para se tornar o senhor e criador de seus próprios valores. Não será mais servo dos valores alheios.

É preciso destruir valores antigos para criar outros. Para isso é necessária muita força, luta e coragem para ir à cata do grande dragão que representa os valores morais vigentes. O “tu deves” do dragão deve ser vencido pelo “eu quero” do leão. É necessária a força do leão para abrir caminho para a liberdade do inventor. Para criar novos valores o leão sofre outra transformação e se torna a criança, que representa o devir. Essas fases não são cronológicas e, sim experimentáveis a cada instante em que se vive. Elas são parte de um processo contínuo. Liberar-se do peso das imposições morais é o caminho para produção do sujeito ético em sintonia com a sua existência.

Travestis idosas aprenderam desde pequenas que os valores morais vigentes não se misturavam bem com elas. Traçando uma analogia entre pensamentos do filósofo Nietzsche e as travestis idosas, podemos perceber que elas sentem desde crianças que as normas de gênero impostas não aumentavam sua potência de agir. Carregam o peso das normas sociais como camelos e se refugiam no deserto de suas solidões pessoais. Sofrem as primeiras exclusões e preconceitos desde tenra idade. Transformam-se em leoas que lutam contra o dragão da heteronormatividade. A partir de então, viram crianças que inventam seu próprio modo de viver baseando-se no cuidado de si e em uma estética própria a custa de muita luta.
http://www.vidag.com.br/rio-de-janeiro/destaques/pedro-sammarco--nietzsche-e-as-travestis-idosas/

quinta-feira, 28 de abril de 2011

"Admiro muito meu filho pela coragem que ele sempre teve", diz mãe de travesti

Quarta-feira, 27 de abril de 2011 - 18h17 Última atualização, 27/04/2011 - 18h37
"Admiro muito meu filho pela coragem que ele sempre teve", diz mãe de travesti
Tatiane Moreno
entretenimento@eband.com.br

Antes de Marcelo nascer, a enfermeira Magali Regina Reis, 47 anos, podia jurar que estava grávida de uma menina.

A gestação foi bem tranquila. Segundo ela, a complicação só apareceu na hora do parto, quando teve eclampsia, a famosa crise de hipertensão, que fez com que mãe e filho fosse obrigados a passar vários dias na UTI (Unidade de Terapia Intensiva). “Depois que recebeu alta ele ficou bem. O Marcelo sempre foi uma criança muito saudável e bonita até os 4 anos. A partir daí começaram as crises de asma, bronquite, e ele acabou emagrecendo bastante”, lembra.

Já na infância, Magali percebeu que o filho era muito retraído e tinha um jeito afeminado, que ficou ainda mais aparente com a chegada de sua irmã. “Ele ficou muito apaixonado pela Bruna, pelas coisinhas dela, então, quando fez 8 anos, decidi levá-lo pela primeira vez a um psicólogo. Ele adorava brincar de boneca, gostava da Xuxa, desenhava florzinhas no caderno e tudo isso quando ainda era muito novinho, ou seja, não tinha qualquer malícia sobre o que estava fazendo”.

Durante conversa com os pais de Marcelo, a médica disse abertamente que o menino tinha fortes traços e tendências de homossexualidade e que eles teriam de aprender a conviver com isso.

“Não vou dizer que não foi um choque. É muito difícil você lidar com a questão da homossexualidade, não por você, mas por todo o preconceito que você sabe que o seu filho vai sofrer. Tanto é que só comecei a deixá-lo sair de casa com 18 anos porque tinha muito medo de alguém bater, machucar ou fazer alguma maldade na rua. E também eu tinha aquele sentimento de negação, de não querer enxergar”.

Com o tempo, ela decidiu dar um basta ao sofrimento e passou a olhar o filho de uma outra forma. “A partir do momento que comecei a aceitar que ele era assim mesmo, que era meu filho, e eu tinha de amá-lo e respeitá-lo da forma que fosse o martírio acabou”, conta.

Marcelo, por sua vez, nunca precisou sentar com os pais para explicar sua orientação sexual. “É engraçado que o pai dele sempre aceitou muito mais do que eu. Quando o Marcelo começou a se vestir de mulher para mim foi muito mais difícil do que para o meu marido. Eu já ficava mais incomodada, tinha um pouco mais de vergonha e não gostava que as pessoas perguntassem na rua, acho que até pelo fato de ser professora e conhecer muita gente”, explica Magali.

Apesar disso, a relação de amor e carinho nunca deu lugar ao preconceito. Mesmo com a dificuldade de lidar com o assunto no início, Magali soube superar seu constrangimento. “Acho que o próprio Marcelo não escolheria isso para a vida dele porque muitas portas se fecham em relação ao trabalho, ao respeito. Meu filho é muito inteligente, é formado, pós-graduado, mas sempre enfrentou dificuldades para arrumar emprego justamente por conta das opções que escolheu seguir. O fato de ser gay não faz dele uma pessoa melhor ou pior do que ninguém, apenas diferente”, ressalta a mãe.

Dentro de casa, Marcelo sempre foi tratado igual aos outros dois irmãos, Bruna e Eduardo, de 23 e 22 anos, respectivamente. “O Marcelo é muito bem resolvido, sempre assumiu as coisas de peito aberto e nunca teve vergonha dele mesmo. Nunca precisei enganar ninguém como vejo por aí muitos homens que são gays, não se assumem, acabam se casando, são infelizes e fazem outras pessoas infelizes. Eu admiro muito meu filho pela coragem que ele sempre teve”, destaca.

A morte de Marcelo e o nacimento de Monique

Em 2007, Marcelo, que é formado em Jornalismo, tomou uma decisão que para ele é irreversível: decidiu se assumir como mulher 24 horas por dia e, desde então, nunca mais usou uma roupa masculina.

“O Marcelo, na verdade, morreu, você está falando com a Monique [nome escolhido em homenagem à apresentadora Monique Evans, de quem é fã]. Criei a Monique em 2001. Até 2007 ela era uma vampira, só existia na noite, mas depois disso ganhou vida própria em todas as atitudes, ocasiões e circunstâncias. Sim, eu faço xixi sentadinha”, diverte-se ela que não aceita mais seu nome de batismo. “Meus pais ainda têm dificuldades para me chamar de Monique, então eles falam ‘filha’. Às vezes soltam o outro nome, mas tentam se policiar ao máximo porque sabem que eu não gosto”, diz. "Já meus irmãos e os outros familiares só me chamam de Monique", completa.

Magali admite que quando o filho decidiu mudar a identidade sentiu muito medo do que pudesse acontecer. “Eu sabia que ele enfrentaria mais preconceito ainda, mas quando o Marcelo me disse que era uma pessoa triste e que quando se olhou no espelho, vestido de mulher, se sentiu realizado, eu não tive mais nem o que falar, nem pensar. Para mim o importante é isso: ele se reconhecer e ser feliz”.

Aos 27 anos, Monique viaja por todo o país fazendo shows e eventos e, de vez em quando, ainda encontra tempo para fotografar como modelo. “Meus documentos ainda estão com o nome Marcelo, mas as fotos são atuais, de menina, então em qualquer lugar que eu precise apresentar meu RG as pessoas logo entendem que se trata de uma travesti”, explica.

Clique aqui e veja a galeria de fotos! http://www.band.com.br/diadasmaes/galeria.asp?ID=1000004012

Quando está na casa da família, em Taubaté, no interior de São Paulo, ela tem uma vida normal e um guarda-roupa recheado de roupas, sapatos e maquiagens, como qualquer mulher.

“A gente vai ao salão de beleza, ao shopping, onde ele quiser. Não temos nenhum problema com isso. Quando o Marcelo faz shows eu ajudo a escolher o figurino e a pagar, principalmente, porque as fantasias são sempre muito caras. Dou roupa de mulher para ele no Natal, se vejo algo bonito, extravagante, e acho que é a cara dele eu compro. E se ele um dia quiser fazer uma cirurgia de mudança de sexo eu não só aprovo, como acompanho, ajudo, cuido, faço o que for. Quem sou eu para dizer que não?”, questiona.

Para Monique, Magali não só é sua mãe, como também sua melhor amiga. “Ela é minha vida, meu porto seguro. Temos uma relação de amizade maior do que a relação entre mãe e filha. É a pessoa que procuro para me aconselhar, me ajudar e dividir meus segredos e experiências”, conclui.
http://www.band.com.br/diadasmaes/conteudo.asp?ID=100000422935