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domingo, 30 de janeiro de 2011
Como usar a tevê em benefício de seus filhos
Pais e filhos precisam aprender a assistir televisão. A dica é de Bia Rosenberg, que coordenou a programação infantil da TV Cultura por 20 anos e é autora do livro “A TV Que Seu Filho Vê - Como Usar a Televisão no Desenvolvimento da Criança” (Panda Books). Criadora dos programas “X-Tudo”, “Castelo Rá-Tim-Bum”, “Cocoricó” e “Glub-Glub”, Bia explica que é comum encontrar pais preocupados com a relação dos filhos com a tevê, mas totalmente desorientados e perdidos. Para ela, a tevê não é positiva nem negativa: o desafio é usá-la a favor dos filhos.
Para Bia Rosenberg, a pouca reflexão sobre o tema pende sempre para o lado negativo da relação criança/ tevê. Atualmente, é impossível ignorar os avanços tecnológicos do âmbito familiar e simplesmente desligar a televisão. A presença dela é inevitável e proibir só aguça ainda mais a curiosidade.
Neste caso, os pais têm de conquistar e exercer autonomia em relação ao uso, e ao mesmo tempo, selecionar a programação, orientar o filho e saber negociar. “O ideal é um bate papo familiar e informal sobre o que é adequado e o que não é.” Não há acordo sobre o tempo ideal para as crianças assistirem tevê, mas a Academia Americana de Pediatria considera adequado duas horas por dia.
A associação também não recomenda que crianças menores de dois anos assistam televisão. E nada de fazer lição, comer ou dormir diante da tela. Cuidar do tempo e do que os filhos vão assistir é tarefa dos pais. A criança deve dar sua opinião sobre o que gosta, mas cabe aos pais enriquecer essas escolhas com opções de qualidade.
Assim, vale até bloquear a tevê para canais e horários em que o conteúdo é considerado inadequado ou o que não acrescente nada a formação delas. Alguns pacotes de assinatura de tevê a cabo dão essa opção. As crianças começam a interagir com o que veem na televisão com seis meses. Bia Rosenberg é taxativa em em relação à programação adulta que elas têm acesso.
“Os programas conhecidos do horário nobre, como novela e telejornal, não são adequados para crianças menores de sete anos e não acrescenta nada de positivo, apenas dão uma percepção errada e alterada sobre a realidade. Assistir a crimes e desastres naturais nos jornais, por exemplo, só as atormentam se aquilo pode ou não acontecer com elas, o que é assustador.” E se a criança chegar a imitar algo violento ou de teor sexual, “os pais não devem se desesperar. Nada de promover debates nem passar sermões, mas dialogar sobre o que foi visto.”
Se a criança assistiu a algo impróprio, a dica de Bia Rosenberg é comentar o que viu e tentar dar exemplo. Aquilo que poderia ser uma avalanche pode servir de pretexto para uma conversa sobre como resolver os conflitos sem a força. “É preciso explicar que brigar não é algo bom, perguntar à criança o que ela achou e dizer que o pai e a mãe resolvem a questão de outro maneira.” Essa troca de informações serve para a criança se sentir valorizada. “Ao perceber que ela deu sua opinião, a criança se sente importante e, consequentemente, aprende o que é certo e o que é errado.”
Um estudo da psicóloga Dorothy Singer, pesquisadora do Centro de Consultoria e Pesquisa sobre Família e Televisão da Universidade de Yale, nos Estados Unidos, afirma que pais não podem abrir mão do controle remoto. Bia Rosemberg concorda e afirma que essa é a mesma atenção que se deve dar sobre ensinar a não atravessar a rua sozinho, escovar os dentes ou fazer a tarefa escolar. São funções paternas.
Segundo ela, por mais arbitrário que pareça, é o mesmo direito que os pais têm de proibir o filho de brincar com uma faca. Para ela, colocar limites desde cedo é mais fácil do que quando o filho é um adolescente e há mais probabilidade de conflitos. “Separar uma hora do dia para ver tevê junto com a criança e explicar a diferença entre ficção e realidade é bacana”, aconselha.
Para os pais que trabalham fora, mas querem ficar antenados sobre o que seu filho assiste, a dica é, quando checar em casa, perguntar o que ele fez durante o dia. E, neste bate papo informal, questionar o que assistiu, se viu algo bacana, se não gostou de alguma cena e sugerir o que assistir no outro dia. “Além de discutir, os pais devem ir também passando os próprios valores por meio do programas da televisão”.
De acordo com a especialista, há de existir uma parceria. “Neste cenário em que circulam milhões de informações, as crianças precisam dos pais para mediar os fatos. Isso ajuda a desenvolver uma visão crítica.” Na opinião de Bia, a televisão é uma “geladeira”: depende o que põe dentro.
Para o psicólogo e psicoterapeuta sexual, Oswaldo M. Rodrigues Jr., do Instituto Paulista de Sexualidade, desenhos animados com traços mais simples e cores fortes são os mais indicados para crianças. “Mesmo que tenham o que nos parece violência, pois assim eles podem aprender como administrar a violência na vida real.”
Diálogo contribui na formação dos valores
Os programas podem, sim, influenciar a sexualidade precoce das crianças. Mas, antes de culpar apenas a televisão, é preciso avaliar o contexto. Crianças até dez anos usam um método de aprender: imitam positiva ou negativamente os comportamentos dos adultos. E isso acontece simplesmente pelo prazer de copiar ou reproduzir. As crianças usarão os estímulos a partir da tevê para modelarem seu comportamento e suas atitudes. “É por meio do diálogo que ela vai aprender a refletir sobre o que é considerado mau comportamento e o que deve ser evitado”, afirma o psicólogo e psicoterapeuta sexual, Oswaldo M. Rodrigues Jr., do Instituto Paulista de Sexualidade.
Antes de esconder o controle remoto, os pais devem refletir sobre o quanto eles próprios influenciam a relação da criança com os meios de comunicação. Se os pais adoram passar horas vendo seus programas favoritos com conteúdo impróprio a ela, o ideal é que a criança pequena não esteja presente. Neste caso, é preciso decidir a programação da família e até abrir mão de uma novela, por exemplo. “Programação para adultos é para adultos. Se expusermos crianças à programação de adultos, estamos programando as crianças para reagirem como adultos, mesmo ainda sendo crianças”, diz.
Os pais não podem usar como desculpa a crença de que o filho assiste a canais impróprios para a idade dele porque gosta. “Crianças têm papéis específicos e quando fazem algo diferente do que se espera delas, isso traz problemas, mesmo que faça sem consequên-cias problemáticas. E conse-quências que são problemas implicam em correr riscos para os quais ainda não estão preparadas para resolver e deles se livrar”, afirma.
O poder de influência da tevê é incontestável. Estudos revelam que crianças que passam mais tempo na frente da tevê com conteúdo comercial são propensas a pedir aos pais que comprem o que viram na tela.
Outro cuidado é não achar que a tevê vai substituir os pais. De acordo com o psicoterapeuta sexual, o papel dos pais é filtrar o que os filhos assistem. “Os pais precisam ser insistentes, constantes neste objetivo.” E completa: “Os pais precisam tomar cuidado com o sentimento de culpa por passarem muito tempo fora de casa e pouco tempo com os filhos.”
Puberdade precoce
Para o endocrinologista pediátrico Raphael Liberatore, o conteúdo exibido pela mídia é um reflexo da sociedade e não a causa das mudanças verificadas no comportamento dos espectadores, em especial das crianças. Dessa forma, para ele, não é a tevê que desencadeia a puberdade precoce - situação caracterizada pelo aparecimento de sinais de puberdade em meninas abaixo dos 8 anos (como o aparecimento de mamas) e meninos abaixo dos 9 anos de idade (com o aumento do volume dos testículos).
Liberatore explica que, em todo o mundo, é crescente o número de caso de puberdade precoce, em especial nas meninas, mas as causas desse fenômeno ainda não estão esclarecidas. O médico conta que há aproximadamente dois anos cientistas descreveram uma proteína chamada kisspeptina.
Essa proteína seria produzida na região do córtex cerebral e estaria relacionada com o desenvolvimento da puberdade. Com base nisso, surgiu a suposição de que estímulos externos sobre o córtex, como os conteúdos de programas de tevê, por exemplo, possam, consequentemente, exercer influência também sobre a puberdade. “Mas isso não está provado cientificamente. É uma conjectura”, diz o médico.
Liberatore cita ainda outras situações que impedem uma relação direta entre tevê, puberdade e sexualidade precoces. Ele comenta que o amadurecimento mais cedo de meninas e meninos também é verificado em países muçulmanos e nos Estados Unidos, onde o acesso a conteúdos eróticos é bastante fiscalizado.
Thomaz Vita Neto
Daniela e Dênis com o filho Rafael: ‘Ele sabe quando falam palavrão, mas entende que é ruim’
Tevês pagas ignoram adequação de horário
No Brasil, quem classifica e monitora os programas de televisão (assim como filmes e jogos eletrônicos) de acordo com a faixa etária é o Ministério da Justiça. Com base em critérios de violência e sexo, os programas são classificados como livres ou podem ser ainda não recomendados para menores de dez, 12, 14 , 16 e 18 anos.
Na tevê aberta, filmes e programas devem ser exibidos em horários determinados. E as classificações estão vinculadas a faixas horárias de exibição. Assim, programas de classificação livre ou não recomendados para menores de dez anos podem ser exibidos em qualquer horário. Já as obras audiovisuais classificadas como não recomendadas para menores de 12 anos só devem ser exibidas a partir das 20 horas; para menores de 14, a partir das 21 horas; para menores de 16, a partir das 22 horas; e para menores de 18, só após às 23 horas.
As tevês por assinatura também precisam indicar a classificação etária de cada atração. Contudo, elas não são obrigadas por lei a vincular faixa etária e horários. Isso acontece porque as televisões pagas têm ferramentas de controle de programação, como dar ao cliente a possibilidade de bloquear canais que considerem inadequados para seus filhos. “As tevês por assinatura têm tecnologia que permite o controle ideal da criança diante da tevê”, diz Alexandre Annenberg, presidente da Associação Brasileira de Televisão por Assinatura.
Cada operadora de tevê paga tem seu sistema de bloqueio. Eles, geralmente, estão descritos nos manuais, nos canais de serviços e até mesmo nos sites de cada uma delas. O cliente pode bloquear, por meio de senha, os canais que não quer que seus filhos vejam. Quando um adulto quiser ter acesso à programação, basta digitar a senha e liberar o canal. O processo de bloqueio varia com as operadoras e também com os diferentes decodificadores que elas oferecem (veja alguns exemplos de bloqueios no quadro acima).
O Ministério da Justiça realiza atualmente um debate público, na internet, sobre a classificação indicativa. Hoje, essa classificação é feita com base em cinco portarias. A intenção é fazer uma portaria única. O diretor do Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação do Ministério da Justiça, Davi Pires, explica que o objetivo é também realizar ajustes para que a lei possa ser atualizada. Quem quiser dar sua contribuição para a discussão deve acessar a página culturadigital.br/classind.
Processo
É o representante legal da obra audiovisual quem faz uma autoclassificação em sua produção. Em seguida, a classificação pretendida é apresentada ao Ministério da Justiça, que tem 60 dias para monitorar essa obra e aceitar a classificação inicial ou reclassificar o produto. No caso de conteúdo televisivo, Pires explica que uma lei de 2001 estabeleceu que televisores teriam de ter sistema de bloqueio de canais.
Contudo, a lei não “pegou”. Por isso, há a necessidade de uma classificação vinculando faixa etária e horário na tevê aberta. Se as determinações de exibição não forem cumpridas, as emissoras podem ser penalizadas. Em caso de irregularidade, o Ministério da Justiça comunica o Ministério Público, que vai exigir o cumprimento das normas. A penalidade pode variar de multa à suspensão da programação por até dois dias, nos casos mais graves. Denúncias podem ser feitas no site do ministério (www.mj.gov.br).
O ministério defende que a classificação indicativa resulta do equilíbrio entre a liberdade de expressão e o dever de proteção à criança e ao adolescente. Pires explica que o ministério faz a classificação acreditando que um conteúdo inadequado pode influenciar negativamente a criança que assistir sozinha, sem auxílio dos pais, a um determinado programa.
Para Pires, quando há o amparo da família, um programa não recomendado pode até ser visto pela criança e gerar um debate, um aprendizado. Como exemplo, ele cita obras que abordam discriminação. Os pais, juntos com as crianças, podem ver esse conteúdo e explicar que a discriminação não é correta.
Thomaz Vita Neto
O casal Solange e Nivaldo acompanha de perto o que as filhas Laura e Letícia assistem na tevê
Canais têm o dever de entreter e informar
Entre um programa educativo e outro, o canal Discovery Kids, cujo público-alvo são crianças em idade pré-escolar, exibe o cãozinho curioso e aventureiro Doki. O mascote do canal pago ensina truques científicos e conta histórias sobre suas aventuras. Outros programas contam histórias criativas que estimulam as crianças a desenvolver um estilo de vida saudável e feliz.
A funcionária pública Solange Zamarioli Moura, 46 anos, mãe de Laura, 9 anos, e Letícia, 5, acredita que o canal é o mais indicado para as pequenas. Ela, que acompanha atenta o desenvolvimento das filhas, entende que a tevê pode influenciar negativamente quando assistem a conteúdos não apropriados. “Em casa não assistimos filmes com temas violentos ou com bruxaria, que podem atrapalhar o sono das minhas filhas.”
A solução para a questão é deixar a tevê ligada na Discovery, e mais do que isso, dialogar sobre o que é visto lá. O que já trouxe resultados. “Esse tipo de educação reflete no comportamento. A Laura, por exemplo, já tem um critério para o que vai assistir. Ela sabe que em um desenho, quando um garoto responde para os pais, não é bacana e pede para mudar.”
Na casa do pequeno Rafael Quinhone Santana, 5 anos, a regra é a mesma. Na tevê aberta, canal é Cultura e, na fechada, Discovery Kids, e mesmo assim a mãe, a dona de casa Daniela, 29 anos, e o pai Dênis, 35, ficam sempre por perto. “Os pais têm o papel de filtrar o que os filhos assistem. Além disso, devem dar o exemplo”, conta Daniela.
Ela sabe que o filho é uma criança inteligente e crítica e, por isso, não esconde o que é certo ou errado. “Ele sabe quando alguém na tevê fala palavrão, mas entende que isso é ruim.” Esse comportamento se reflete na escola. “Ele não é uma criança agressiva e se dá bem com todos os amigos e professores.”
De acordo com Bia Rosenberg, autora do livro “A TV Que Seu Filho Vê - Como Usar a Televisão no Desenvolvimento da Criança” (Panda Books), a criança só assiste o que gosta, pois ela ainda não tem a consciência do que é saudável ou não. “Por isso, cabe aos pais a tarefa de fazê-las experimentar programas bacanas”, afirma.
O caminho para isso inclui estimulá-las a assistir programas educativos e controlar o tempo em que ficam vendo tevê e não fazer da escolha uma moeda de troca. Vale destacar, ainda, que a influência dos pais é provavelmente mais importante que a de qualquer comercial ou programa. “Para a criança aprender a gostar de algo, ela tem de experimentar antes. E isso, claro, começa em casa.”
Diversão e informação
Entreter e informar. Esse é o objetivo de alguns canais que têm o público infantil e adolescente como maioria. Entre eles está o Nickelodeon, que afirma apresentar questões que levem a audiência a pensar, discutir e se engajar em assuntos atuais, como responsabilidade social, bullying, atividades físicas, tolerância e respeito à diversidade. “O canal procura trabalhar com os conceitos de humor, diversão, irreverência e relação aberta com todos os públicos, incluindo diferentes raças, cores e religiões”, posiciona-se a Nickelodeon, em nota.
O gerente de programas infanto-juvenis da TV Cultura e diretor do “Cocoricó”, Fernando Gomes, defende que a principal função da tevê é o entretenimento, mas que este pode estar atrelado ao bom conteúdo e informação. Para ele, programa certo para o espetador certo traz ganhos. “Bons programas, com temas divertidos e curiosos, bem produzidos e voltados ao público certo têm tudo para estimular a criatividade.”
A emissora também destaca a importância da família. “Os pais são os responsáveis pelo que seus filhos menores podem ou não assistir, e isso vale tanto para a TV aberta quanto para os canais fechados”, conclui Anna Valéria Tarbas, gerente de programação da Cultura.
http://www.diarioweb.com.br/fmdiario/Noticias/Comportamento/46704,,Como+usar+a+teve+em+beneficio+de+seus+filhos.aspx
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