07 de fevereiro de 2012 • 14h40 • atualizado às 15h38
"Pedir perdão pelos atos dos padres pedófilos não basta", disse nesta terça-feira uma vítima, que exige que os superiores hierárquicos que tenham encoberto abusos reconheçam sua responsabilidade, durante um simpósio sobre a pedofilia no Vaticano. Única vítima convidada a este encontro, a irlandesa Marie Collins, de 64 anos, abusada sexualmente por um padre aos 13 anos, contou seu calvário diante de cerca de 200 especialistas e bispos.
"Acabava de completar 13 anos e estava em uma etapa muito vulnerável, a de uma menina doente no hospital, quando um padre abusou sexualmente de mim. Não conhecia a sexualidade e minha inocência se somou a minha vulnerabilidade", disse, ao descrever o pesadelo dos repetidos abusos do sacerdote em Dublin. "Quando começou a tocar em mim sexualmente, fingindo a princípio que era um jogo, fiquei chocada, resisti, pedi a ele que parasse. Mas não se deteve. Enquanto me manuseava, dizia que 'era um padre' e que 'não podia agir mal'. Tirou foto de minhas partes mais íntimas e de meu corpo e me disse que era 'estúpida' se pensava que ele agia mal", conta Collins, acrescentando que "esses dedos que abusavam de meu corpo durante a noite me ofereciam a hóstia na manhã seguinte".
Collins também contou sua longa depressão e "os dois anos mais difíceis de sua vida" quando, aos 40 anos, ao decidir revelar a agressão sofrida, as autoridades católicas acobertaram seu agressor. "Minha fé em Deus não foi afetada. Posso perdoar o que abusou de mim. Reconheceu seu erro. Mas como sentir respeito pela direção de minha Igreja? Pedir perdão pelos atos dos sacerdotes pedófilos não basta, é preciso que reconheça sua responsabilidade pelo mal e pela destruição causados às vítimas e as suas famílias pela ocultação por vezes deliberada e pela má gestão dos assuntos dos superiores", disse. "Tentar salvar a instituição do escândalo causou o maior dos escândalos", insistiu. "O melhor da minha vida começou quando quem abusou de mim foi levado à justiça. (...) "Então trabalhei com minha diocese e com a Igreja Católica na Irlanda para melhorar sua política de proteção às crianças. Minha vida já não está devastada. Tem sentido e valor", acrescentou.
Mais cedo, Sheila Hollins, psiquiatra britânica, abordou o caso de "muitos sacerdotes" vítimas de abusos em sua juventude, um trauma "que contribuiu para sua incapacidade de compreender sua sexualidade e sua decisão de se manter solteiros, como os padres". Ou de mães que criaram sozinhas seus filhos, com grandes dificuldades sociais, que eram abordadas por pedófilos que viam seus "filhos como presas fáceis". Hollins denunciou a intimidação do pádre que havia abusado dela: "imaginem que é padre e confessor e utiliza sua autoridade espiritual para garantir que seu crime se mantenha em segredo".
Na segunda-feira, na abertura do evento, o Papa disse que "aliviar as vítimas é de suma importância". Esta prioridade "deve coincidir com uma profunda renovação da Igreja", acrescentou. O cardeal William Levada, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, e, como tal, principal autoridade da gestão do caso pelo Vaticano, lembrou as novas estratégias da Igreja no tema: ouvir as vítimas e colaborar com a justiça civil. Ele reconheceu o "desajuste" do direito canônico e a necessidade de uma resposta "multidimensional". Monsenhor Levada regressou ao Vaticano imediatamente após sua intervenção, o que foi criticado pelas associações de vítimas, que consideram que temia ser exposto a perguntas incômodas feitas pela imprensa.
Segundo o biógrafo do papa Mario Politi, "um assunto a ser resolvido é a obrigação de denunciar por parte do bispo à polícia e à promotoria". "Na França é obrigatório, mas em outros países não é. É necessário que o Vaticano dê indicações precisas que sejam sempre válidas", disse à AFP. "A Igreja está disposta a propiciar uma investigação em cada diocese sobre os abusos do passado?", como o fez, por exemplo, o cardeal alemão Reinhard Marx na de Munique, perguntou. O jornal Il Fatto Quotidiano cita um procurador de Milão, Pietro Forno, especializado nestes temas, que comentou recentemente: "A hierarquia católica nunca foi obstáculo para minhas investigações, mas, durante tantos anos, nunca me chegou uma denúncia de um bispo ou de um sacerdote".
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