terça-feira, 12 de julho de 2011

´A outra´ gera polémica

´A outra´ gera polémica

A dor de dividir o marido
Depois de alguns anos de vivência, o anterior companheiro de Maria do Céu decidiu visitar a sua terra natal: o Úige. O que parecia ser uma viagem normal, acabou por se tornar fatal para uma relação que se adivinhava duradoira. Além dos víveres, para espanto da senhora, o cônjuge regressou das terras do "bago vermelho" com uma outra encomenda na bagagem, uma conterrânea com quem acabou por ficar por suposta obrigação dos seus parentes.

"Isso aconteceu em 1992. Ele contou-me que foi obrigado a ficar com ela por ser da mesma terra. Tivemos de viver juntas na mesma casa e houve vezes em que tínhamos de partilhar a mesma cama com o nosso marido. Ele dormia no meio, eu à frente e ela atrás dele, até que chegou um tempo em que já não aguentava mais e tive de me separar", contou a nossa interlocutora.
Depois do afastamento, Maria do Céu não conseguiu se conciliar com o companheiro. E este aproveitou o tempo de separação para fazer outros dois filhos com a sua conterrânea. Infelizmente, as duas acabaram por perder definitivamente o marido, tendo ele investido numa terceira aventura amorosa que dura até hoje. Agora, a anterior primeira é a segunda de outro homem que conheceu há menos de um ano.
O facto de se ter tornado a outra de um homem já comprometido não a incomoda. "Eu aceitei, por que é que haveria de negar? Sei que é complicado aceitar que amanhã ele vá dormir com outra e no dia seguinte vem passar à noite comigo", defendeu-se a jovem, hoje quase refeita do anterior desaire amoroso. E acrescentou: "faço isso por amor, mas, na realidade, muitas aceitam isso por interesses materiais. Se fosse para ser a terceira ou a quarta é que não admitia, por nada neste mundo"
Apesar de ser um assunto cada vez mais presente, a existência das «segundas, terceiras ou quartas esposas» nunca mereceu tantos comentários como nos últimos dias, por causa da disseminação da música "A Outra", inserida no último disco do músico Matias Damásio, intitulado "Amor e Festa na Lixeira". Trata-se de uma canção em que uma segunda esposa reclama os seus direitos e acabou por acrescentar mais uma «pitada de sal» na análise deste fenómeno socio cultural, com muitos contornos, incluindo religiosos. Até hoje a doutrina cristã considera a prática da poligamia um pecado, ao passo que os muçulmanos contrariam claramente o posicionamento dos seguidores de Cristo e consideram ser um absurdo
Embora afirme não conhecer linearmente o conteúdo do último sucesso do jovem de Benguela, a socióloga e professora universitária Fátima Viegas, foi uma das convidadas de O PAÍS para falar sobre a poligamia. Ela salientou que "merece, efectivamente, várias interpretações e implicações sociais", porque, de acordo com a directora do Instituto dos Assuntos Religiosos (INAR), esta sociedade rege-se por um código de família monogâmico, onde o marido tem a sua mulher e vice-versa. "Quando aparece uma outra, é alguém que está a introduzir algo ou a querer perturbar aquilo que tem o seu percurso normal. Vem desestabilizar uma família já constituída", explicou a docente
Não obstante a existência de um código de família monogâmico, observa-se cada vez mais o aparecimento de novos casais, onde o homem já é comprometido oficialmente ou aos olhos de Deus. Outros até vivem em união de facto com as primeiras, segundas ou terceiras senhoras. Isso desenrola-se perante o olhar silencioso dos familiares de ambas as partes e até das companheiras casadas (ou oficiais), num país em que a poligamia nunca foi institucionalizada
"Seja como for, mas não me conformo comisso. Só de pensar que o meu marido vai passar uma noite fora, é um grande transtorno. É uma noite que se perde e a casa fica vazia. Penso que ela também foi usada e o meu desejo é que um dia ele regresse definitivamente. Não tenho boa relação com a minha rival, mas não quer dizer que tenhamos problemas", atirou Sãozinha, outra moradora de Viana, ainda na casa dos 20 anos, mas com três filhos e um quarto a caminho
Sem quaisquer argumentos técnicos ou científicos, a rapariga, que viu o marido partir recentemente para uma segunda relação, depois de 14 anos juntos, descreveu algumas das razões que fazem com que muitos homens partam à procura de novas parceiras
Normalmente, na visão da nossa in terlocutora, os argumentos passam de acordo com explicações que diz ter recebido de amigos – pela falta de respeito aos maridos ou parentes destes e os desentendimentos na vida sexual
O recurso aos eventuais desentendimentos sexuais na cama não é encarado como base para muitas das separações e os homens saiam logo à caça da segunda ou terceira. As senhoras ouvidas pelo jornal acreditam que o "assunto cama", muitas vezes considerado polémico ou mesmo "sagrado", pode ser resolvido com a ajuda de médicos ou outros especialistas em sexologia.
Questionada pelo jornal O PAÍS sobre os motivos que levaram o seu esposo a encontrar mais uma parceira, Sãozinha respondeu prontamente: "ele só diz que também não sabe e que um dia vão entender. Mas, na realidade, nunca conseguiu dar uma resposta que convença às pessoas"
Sarcásticas, Sãozinha e Maria do Céu, os nomes fictícios com que as duas senhoras se apresentaram ao jornal, juraram a pés juntos que o dinheiro é a principal causa que empurra os homens para as "outras", porque muitos deles sentem-se incomodados quando têm os bolsos cheios. E o contrário. "Quando estão fracos voltam à primeira e ficam. Isso é verdade e temos prova disso. E aqueles que têm mais de duas mulheres é pura ilusão e orgulho, porque não amam nenhuma delas.
"Quando não têm dinheiro não se conseguem deslocar", responderam de seguida.
Além dos problemas emocionais, elas defenderam que os pais polígamos podem causar, directa ou indirectamente, outros problemas no seio da família, independentemente das suas posses. Uma delas explicou que, desde que o esposo bandeou-se para a segunda, a situação no seu lar começou a deteriorar-se em todos os sentidos.
Após a concretização da segunda relação, a jovem"São" viu o tecto desabar. O salário do esposo passou a ser repartido com a rival, assim como as roupas e os bens de primeira necessidade que ele levava regularmente à casa. "O sentimento também diminui e aos poucos começou a reduzir a atenção que me prestava. Ninguém se conforma com isso, sobretudo quando fazes o jantar e ele não aparece para comer. Quem mais tem paciência para voltar a fazer uma boa refeição, se não tem certeza que ele vai aparecer?", questionou Sãozinha.
Visivelmente abalada, "São"ainda tentou buscar o consolo de uma companheira durante a conversa com este períodico. Só que a última não está com rodeios quando o assunto é ser a "outra" ou partilhar o parceiro com uma segunda ou terceira. "Prefiro ficar como estou, solteira e boa rapariga. Não aceito ser a segunda, porque isso não tem muita piada. A pessoa é insultada constantemente pela rival", comentou a amiga de Sãozinha.
Porém, a culpabilização dos homens não é algo tão consensual mesmo em muitos círculos femininos. Algumas acreditam que perdem os seus companheiros porque as segundas ou terceiras recorrem, muitas das vezes, a práticas obscuras para cativá-los. Usam uma substância que conhecem pelo nome de "medicamento" que utilizam para "cozinhar o marido das outras", segundo as nossas interlocutoras.
Verdade ou mentira, Sãozinha e Maria do Céu corroboraram que o "medicamento", como o consideram, surte efeitos imediatos. Ao ponto dos esposos esquecerem as primeiras e instalarem-se, definitivamente, nos aposentos das"outras".

8 de Dezembro de 2008
http://www.opais.net/pt/opais/?id=1657&det=1240&ss=sexologia

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